Em que consiste a osteogénese imperfeita?

Trata-se de uma doença rara, genética, que afeta uma proteína, o colagénio tipo 1, presente em vários tecidos do organismo e ,em particular, nos ossos. A fragilidade óssea é a principal manifestação. As fraturas podem ocorrer logo in utero ou ao longo da vida. Porém, esta doença também afeta outros órgãos, como os olhos, o coração, os pulmões, assim como as articulações, tendões, músculos. Isto acontece porque existe uma diminuição ou uma alteração do colagénio tipo 1. A mais comum é a tipo I e as mais grave é a tipo II.

Qual a causa desta patologia?

Costumo dizer que a osteogénese imperfeita não é uma doença mas um conjunto de doenças, porque existem vários genes que podem ter este tipo de manifestação. E esse é o problema: não há apenas um. Podem ser vários genes que contribuem para diferentes manifestações clínicas, o que torna o processo de diagnóstico e de cura mais difícil.

“Atualmente, temos alguns tratamentos que melhoram o prognóstico, mas sem cura.”

As primeiras manifestações são visíveis logo in utero ou à nascença?

Depende da gravidade da doença. Há tipos de osteogénese imperfeita que são mesmo incompatíveis com a vida e o bebé acaba por falecer in utero. Noutros tipos manifesta-se in utero e a criança nasce com algumas fraturas ou estas surgem a partir do momento em que começam a dar os primeiros passos e as primeiras quedas. Mas também pode ser mais ligeira, quando as pessoas têm algumas fraturas ao longo da vida, que podem ser associadas a acidentes.

Em termos de especialidades, quais as que mais tratam esta patologia?

Estes doentes devem ser sempre acompanhados por equipas multidisciplinares. Dependendo do tipo de gravidade, terão diferentes necessidades. A Pediatria, Reumatologia Pediátrica, Reumatologia (Adultos), a Genética são muito importantes, porque é sempre preciso um médico que faça a gestão das diferentes manifestações, encaminhado de acordo com os órgãos afetados.

A Ortopedia é fundamental. O ortopedista tem um papel muito importante, quer no tratamento das fraturas, quer na sua prevenção. Perante muitas deformidades ósseas é essencial a prevenção, encavilhando os ossos longos, daí que a Ortopedia deva avaliar o doente precocemente. A reabilitação é outra valência a ter em conta para que se aposte em exercícios de fortalecimento muscular, de melhoria da dor e da funcionalidade. A Medicina Física e de Reabilitação também deve estar presente desde os primeiros momentos. Mas há ainda a Otorrinolaringologia, a Cardiologia, a Pneumologia, a Oftalmologia.

Relativamente ao diagnóstico, os sintomas a que se deve estar atento é precisamente às múltiplas fraturas?

O diagnóstico é, essencialmente, clínico. Há uma série de características clínicas que devem deixar o médico em alerta. O tipo de doença mais frequente é o tipo I, afetando cerca de 90% dos doentes, podendo ser uma forma mais ou menos ligeira. Na idade pediátrica, por exemplo, chamo a atenção para as fraturas recorrentes e a existência de algumas deformidades ósseas como encurvamento dos ossos longos – e , embora no tipo I não seja tão frequente, pode surgir uma escoliose em fases muito precoces. Outras manifestações são a esclerótica dos olhos azulada e alterações de dentição.

“A confirmação do diagnóstico é feita através de um teste genético, daí que seja fundamental contar com o apoio do geneticista, quer no diagnóstico, quer no aconselhamento familiar.”

Em Portugal, quantos casos estão diagnosticados?

Sendo uma doença rara, haverá um doente em cada 10/15 mil pessoas, por conseguinte, deverão ser 600 doentes. Na Associação temos cerca de 300 doentes identificados, desde bebés a idosos.

Falta um registo nacional?

Precisamente. A nossa luta é ter esses dados e a criação de centros de referência, porque é uma patologia complexa, que exige experiência. Num país pequeno como o nosso não faz sentido que todos os médicos tenham um conhecimento profundo sobre osteogénese imperfeita, mas devem existir centros, nos quais temos profissionais com um elevado grau de expertise. Atualmente, já temos equipas multidisciplinares em alguns hospitais, mas ainda há um caminho a percorrer, sobretudo em algumas especialidades.

Existe dificuldade no acesso ao tratamento?

Como associação, sempre que identificamos um doente, fazemos o seu encaminhamento para os clínicos com maior experiência. Às vezes, não é fácil; exige muita dedicação da nossa parte e também dos clínicos .

Vão realizar o Bone Dysplasias 2024. O objetivo é alertar para a doença, além da discussão mais técnica?

Temos vários projetos na APOI, um deles é o Aliança INquebrável, que se iniciou, em 2016, num congresso científico que reuniu profissionais de mais de 80 países. Na altura, este projeto constou de uma aliança com a associação espanhola de Osteogénese Imperfeita e reunimos, num congresso científico, profissionais de todo o mundo onde o obetivo foi melhorar e incentivar o conhecimento nesta doença. Desde então, temos tido vários encontros para profissionais de saúde, doentes e familiares, mas não de tão importante dimensão.

A partir do momento em que a Rede Europeia de Doenças Ósseas abriu polos em Portugal, nomeadamente no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, que é membro da Rede Europeia de Referência em Doenças Ósseas Raras (ERN BOND), achámos que era importante fazer uma nova Aliança INquebrável agora com a ERN BOND. Serão dois dias dedicados ao conhecimento desta e outras doenças na área das displasias ósseas, tendo como público alvo os profissionais de saúde e um outro dia para doentes e familiares, que inclui workshops dedicados a como lidar com fraturas ósseas e a reabilitação. O lema da APOI é “Conhecer melhor, é tratar melhor” e este é o objetivo deste simpósio.

MJG

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