Para Francisca, sete anos, foi a primeira vez que teve que equilibrar à cabeça o tabuleiro -- uma cesta de verga com seis canas onde estão espetados cinco pãezinhos, as flores que fizeram na escola e a pomba do espírito santo em latão -, mas não foi a primeira vez que participou no cortejo.

Há quatro anos desfilou com uma cesta florida na mão, como acontece agora com as meninas que frequentam o pré-escolar.

Ao seu lado desfila José Maria, com 10 anos, que vive em Queijas (Oeiras), mas não se importa de acompanhar a prima pela segunda vez.

"A turma [do 2.º ano da EB1 de Santo António] tem 19 meninas e sete rapazes, por isso temos que ir buscar alguns 'emprestados'", disse à Lusa Lisete Conceição, a professora que nasceu em Angola e veio parar a Tomar há 35 anos, depois de, num trabalho da licenciatura tirada em Coimbra, ter escrito o livro "Pelo Caminho dos Tabuleiros", que ajuda agora as escolas a trabalharem o tema.

"Trabalhamos a festa nas disciplinas de História, Matemática Português, mas temos também 'workshops' para a montagem dos tabuleiros, onde fazemos as flores e latoaria para as coroas. E decorámos as montras de quatro lojas", afirmou

Com apenas 28 crianças no cortejo -- "é a escola mais pequena da cidade" -, Lisete Conceição sublinhou o papel do "Cortejo dos Rapazes", em tudo semelhante ao dos adultos - com as meninas trajadas de branco e fita da cor predominante do tabuleiro e os rapazes de camisa branca com gravata da cor da fita e calça, barrete e cinta preta, os "aguadeiros", os "fogueteiros" e as bandas de música - na passagem de uma tradição que, sublinha, se enquadra no conceito de património imaterial da humanidade.

Sentado na sua cadeira de rodas, Manuel Bonet, agora com 80 anos, observa a bênção dos tabuleiros das crianças na Praça da República.

Em 1991 era ele o mordomo da festa e, instigado por duas professoras, foi ele o responsável pela introdução das crianças numa festa com origem pagã (simbolizando a época das colheitas) que adquiriu caráter religioso na Idade Média, com a Rainha Santa Isabel.

"Foi preciso vencer muitas resistências, sobretudo da igreja", disse à Lusa.

A introdução do Cortejo dos Rapazes "abriu novos horizontes à festa. Agora participam pessoas de todas as famílias. Já não são só pessoas do campo. Abriu-se a outras classes sociais e aumentou o entusiasmo pela festa", afirmou.

O atual mordomo, João Victal, concorda.

O "Cortejo dos Rapazes" tem servido de "viveiro" para rejuvenescer e manter a festa viva, fazendo dela uma manifestação de "grande juventude e grande alegria", disse à Lusa, realçando o facto de a comissão da festa fazerem parte elementos que participaram no desfile de 1991.

Sendo o "Cortejo dos Rapazes" para crianças dos quatro aos 11 anos e o dos adultos para os que têm mais de 18 anos, os jovens dos 12 aos 17 anos são chamados a participar nos preparativos, nomeadamente na confeção das flores.

A festa começa a ser preparada um ano antes, com a decisão da sua realização a ser tomada pelo povo, em assembleia convocada pela presidente da Câmara, como é tradição, seguida da eleição do mordomo.

Na quinta-feira, serão inauguradas, às 20:00, as ruas ornamentadas, seguindo-se, na sexta-feira ao final da tarde, o cortejo do mordomo e no sábado cortejos parciais de tabuleiros durante a manhã, estando o cortejo principal, este ano com 682 tabuleiros, marcado para a tarde de domingo.

A festa termina na segunda-feira, dia 13, com a distribuição do bodo - oferta de carne, pão e vinho a pessoas previamente identificadas.

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